“Andar com o auxílio de uma tecnologia que usa a força do meu próprio corpo é a prova de que todo meu esforço valeu a pena” celebra Mara Gabrilli (PSD- SP) sobre o exoesqueleto Atalante ao JCB.
Em 27 de abril de 2023, Mara Gabrilli (PSD- SP), ex-candidata à vice-presidência da república em 2022 e atual senadora pelo estado de São Paulo, compartilhou um vídeo que viralizou em suas redes sociais: o teste do exoesqueleto Atalante. Após quase 30 anos sem movimentar as pernas devido a um acidente de carro, a parlamentar pôde, enfim, sentir a sensação de andar novamente com o auxílio da nova tecnologia. (https://www.instagram.com/reel/CrjHQvqudni/?igshid=NjZiM2M3MzIxNA==)
Apesar dos testes com a senadora terem ocorrido em Nova Iorque (NY, EUA), o instrumento utilizado é de origem europeia, especificamente, da empresa francesa Wandercraft. (https://en.wandercraft.eu/). Buscando, inicialmente, a reabilitação de vítimas de AVC- agora, já expandido para paralisia com causas diversas e diferentes tipos de redução de mobilidade -, a startup desenvolveu o Atalante considerando abordagens que buscam tornar a experiência o mais próxima de um caminhar usual: braços livres, movimento multidirecional, coluna ereta, utilizando o peso do próprio corpo e dois pés no chão. O esperado é que o exoesqueleto torne seus usuários capazes de realizar tarefas do dia-a-dia, fornecendo-os, assim, liberdade.
Quem pode utilizar o exoesqueleto, de acordo com a empresa Wandercraft, são adultos com paralisia total ou parcial, ou com hemiplegia (paralisia em apenas um lado do corpo) causada por danos cerebrais. Apesar da inspiração e semelhança fonética com Atalanta, a corredora da mitologia grega, há, ainda, a ressalva de que o aparelho não é designado para realização de esportes ou subir e descer escadas.
O equipamento foi projetado para ser ajustável ao paciente e seus devidos estágios de reabilitação motora. Para isso, promove o auto suporte (o usuário consegue, de forma segura, ficar de pé no exoesqueleto) ao atuar, principalmente, na região quadril-joelho-calcanhar, com um total de 12 diferentes níveis, e utilizar os controles intuitivos do corpo humano.
O Atalante funciona da seguinte maneira: após preso aos ombros, peito, quadril, joelhos e pés, o paciente pode utilizar um controle para o ajudar a levantar (visto que ainda esteja sentado vestindo o traje). Uma vez em pé, a movimentação é dinâmica: para frente, trás, lado, desviar de objetos, entre outras direções. A bateria do instrumento dura 2 horas de uso contínuo, monitorada em um aplicativo que mostra quantos passos foram dados, a progressão no tratamento e o nível de ajuste escolhido para a etapa de reabilitação do momento. No total, a massa do traje é de 74,843 kg, tendo como principais materiais o Zical (liga metálica constituída de 88% de Alumínio, 6% de Zinco, 2,5% de Magnésio e 2% de Cobre), aço inoxidável e fibra de carbono. O custo do equipamento para hospitais é 176.000 dólares (862.000 reais), porém, a empresa Wandercraft procura baixar o preço para Atalantes pessoais, chegando em 150.000 dólares (735.000 reais). Infelizmente, ainda não há previsão de lançamento para o mercado.
Em entrevista ao JCB, Mara Gabrilli (PSD- SP) comenta sobre tais aspectos únicos que tornam o exoesqueleto tão revolucionário para a ciência da acessibilidade, complementando com implicações sociais e vivências pessoais:
Pergunta: Como o convite para testar o Atalante chegou em você?
Mara: Há muito tempo trabalho para impulsionar o desenvolvimento de tecnologias de reabilitação no Brasil. Isso vem bem antes da política, quando fundei uma organização para fomentar pesquisas para a cura de paralisias. Muitos equipamentos que já estão disponíveis aqui em nosso país, em especial na capital São Paulo, já foram testados por mim e hoje eu os utilizo, como a Lokomat, por exemplo. Então o convite surgiu de uma forma muito natural, justamente pelo meu histórico e luta para garantir reabilitação e saúde aos brasileiros.
Pergunta: Como funciona a adaptação motora ao Atalante?
Mara: É possível regular o equipamento para trabalhar com a força do seu próprio corpo. No meu caso, no primeiro dia, fiquei 66 minutos andando e não tive queda de pressão, o que é comum entre muitas pessoas com a minha deficiência. No segundo dia, eles tiraram um pouco mais da força do equipamento, foi quando eu senti ele mais pesado. Depois, soube que usei 70% da minha força no exercício. Isso é incrível. Na verdade, o Atalante permite que a pessoa “vista” o exoesqueleto e uma vez que o robô contém um sistema de controle de equilíbrio, permite maior estabilidade. Mesmo que o paciente se incline e faça movimentos com o tronco, o robô mantém o equilíbrio sem cair.
Pergunta: Você já tinha testado algum exoesqueleto antes? Qual o diferencial do Atalante comparado a outros exoesqueletos?
Mara: Tempos atrás, nos anos 2000, surgiu um equipamento que permite aos cadeirantes andar em cima de uma esteira. É a Lokomat, que hoje está disponível em locais como a AACD e a Rede Lucy Montoro. Eu treino nele desde então. Ando seis, sete quilômetros por semana. Depois, passei a procurar pelo exoesqueleto, mas era difícil encontrar um que me contemplasse aqui no Brasil porque tenho poucos movimentos de braço e quase todos exigem uma força braçal para funcionar. Normalmente, são feitos para paraplégicos, mas eu sou tetraplégica. Então é aí que reside o grande diferencial do Atalante. Ele não exigia força dos braços.
É interessante também falar que a empresa criadora do Atalante é uma startup francesa onde 80% dos funcionários são da área de Tecnologia da Informação. Ele foi feito com um algoritmo criado e aprimorado por mais de 10 anos. Ele permite que você ande de lado, de costas, faça curvas. Além disso, falamos de um equipamento leve, com 80 kg, feito de um material que lembra um PVC. Ou seja, ele não machuca.
Pergunta: Sabendo que no Brasil há uma quantidade considerável de pessoas com mobilidade reduzida e dificuldades locomotoras que apreciariam a oportunidade de utilizar o exoesqueleto, o que falta para o Atalante chegar aqui? Quais outras soluções de acessibilidade devem ser prioridade no Brasil antes da chegada de uma tecnologia de alto valor estimado, como o exoesqueleto?
Mara: É importante explicar que o exoesqueleto ainda não é vendido para pessoa física. O que estamos estudando é uma forma de trazer o Atalante e deixá-lo disponível em locais que já têm estrutura para tal, como os centros de reabilitação da ACCD, Lucy Montoro e Rede Sarah. Também cabe informar que esse equipamento precisou ser aprovado pelo FDA, que é o órgão regulador dos EUA, para que pudesse ser comercializado. Isso quer dizer que o Atalante ainda precisa ser instrumento de pesquisa aqui no Brasil para obtermos a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). É um processo bem protocolar que ocorre no mundo todo, como os testes realizados para liberar um determinado medicamento, por exemplo.
O que posso garantir é que estamos empenhados em trazer o equipamento para que muitos brasileiros possam se beneficiar andando. Daremos início o mais rápido possível aos testes. É o primeiro passo, mas de uma importância gigante.
É claro que temos inúmeras dificuldades para garantir acesso à reabilitação a todos os brasileiros, a começar pela dispensação de órteses e próteses. Mas trazer o Atalante não anula essa necessidade, tampouco impede que os acessos se aprimorem. Ao contrário, mostra a importância de garantir tecnologia de reabilitação. Mostra, sobretudo, que a deficiência está na falta de acessos e não nas pessoas.
Pergunta: O que o acesso ao equipamento significa para você, tanto como uma pessoa tetraplégica, quanto representante de toda uma parcela populacional que vivencia situações semelhantes às suas?
Mara: Poxa, significa MUITO. São 28 anos desafiando a inércia e a gravidade desde que quebrei o pescoço. E na cadeira de rodas eu sempre trabalhei para resgatar movimentos. Então chegar ao momento de andar com o auxílio de uma tecnologia que usa a força do meu próprio corpo é a prova de que todo meu esforço valeu a pena. É emocionante, é um universo de possibilidades que se abre não só para mim, mas para milhares de pessoas. É a esperança em sua essência maior.
Pergunta: A falta de “braços livres” é pouco contemplada quando se vê alguém com mobilidade reduzida. O Atalante já consegue devolver essa liberdade. Poderia falar um pouco sobre isso?
Mara: Pois é, foi exatamente isso que me instigou a conhecer o Atalante. Eu lutei MUITO para deixar de ser empurrada em minha cadeira e passar a conduzi-la sozinha. Então vocês podem imaginar a minha satisfação em ter meus braços livres e consegui me locomover em diferentes direções.
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