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Entendendo o Ciclo Circadiano: Como Nosso Relógio Biológico Funciona

Maria Fernanda Fagundes Gattass

O ciclo circadiano é um dos 4 ritmos biológicos do nosso corpo. Ele controla a programação do padrão de sono-vigília ao longo de um dia de 24 horas. Quando devemos estar acordados e quando devemos estar dormindo. Ou, pelo menos, a sensação e o estado físico que está envolvido em cada um desses momentos. Por que a luz nos mantém acordado? O que de fato acontece no nosso estado de sono-vigília durante o dia? Qual é sua ligação com nossa atenção? Todas essas são questões que os cientistas, especificamente neurocientistas, tentam responder há algumas décadas através do ciclo circadiano.

O que é o ciclo circadiano?


Como já foi mencionado anteriormente, o ciclo circadiano é responsável pela regulação de nosso estado de sono-vigília. Ele consegue fazer isso por meio de diversos fatores externos e internos à fisiologia humana, mas nesse artigo serão abordados alguns dos principais reguladores: as células do núcleo supraquiasmático, a luz e a oscilação das substâncias químicas adenosina, melatonina e cortisol no organismo​.


Figura 1 - Estado de alerta ao longo do dia regulado pelo ciclo circadiano
Figura 1 - Estado de alerta ao longo do dia regulado pelo ciclo circadiano



O papel das células neural stem cells


As células NSC encontram-se no núcleo supraquiasmático, dentro do hipotálamo (onde vários processos como a regulação da temperatura, do cortisol, da sensação de fome e saciedade​ e dos hormônios (na glândula pituária) acontecem). Essa célula produz as proteínas CLK e BMAL1​, que se juntam e promovem a expressão dos genes ‘period’; e; ‘cryptochrome’. As proteínas produzidas dessa reação (PER e CRY) se juntam e inibem a transcrição de seus genes​ após um tempo. À medida que elas se deterioram, a transcrição é retomada e o ciclo recomeça​, com duração de, aproximadamente, 24 horas. Pode-se dizer que é o nosso relógio interno ao nível celular, o qual é seguido por todas as células do corpo.


‘Zeitgeber’

Esse nome esquisito foi usado pela primeira vez pelo cientista alemão Jürgen Aschoff, um dos fundadores da cronobiologia, para denominar os fatores que servem de ‘sincronizadores’ de nosso relógio interior. Nosso relógio interno não é perfeito e, por isso, todo dia o corrigimos. O fator mais efetivo nessa regulação é a exposição à luz do sol. Existem células fotorreceptoras localizadas na retina que captam essa luz e mandam uma mensagem para o cérebro através do nervo óptico, informando a presença de iluminação. Dessa forma, é possível identificar facilmente o momento do dia e se alinhar a isso. Entretanto, outros agentes também podem atuar nesse processo, como os momentos onde ingerimos comida, praticamos exercício e até a mudança de temperatura do ambiente.


Em um experimento de 1938, o fisiologista estadunidense Kleitman e seu aluno Richardson da Universidade de Chicago passaram mais de um mês dentro de uma caverna para estudar o padrão desse ciclo. Eles concluíram que, sem a intervenção do sol, o relógio interno dura um pouco mais de 24 horas. Esse exemplo permite mostrar a imperfeição desse ciclo e como esses ‘Zeitgebers’ são importantes. Além disso, é possível pensar que a estratégia utilizada por eles parece rudimentar, mas é preciso entender que o ramo da ciência que estuda o sono pode ser considerado relativamente atual, com o descobrimento do sono REM, uma das fases do sono, somente em 1953. Uma das técnicas mais utilizadas no estudo do sono e do cérebro, a ressonância magnética funcional (fMRI), foi somente desenvolvida em 1990. Portanto, a estratégia utilizada por eles era aquela disponível na época.


Figura 2 - Foto tirada durante o experimento de Kleitman e Richardson
Figura 2 - Foto tirada durante o experimento de Kleitman e Richardson

O impacto da adenosina

Muitos devem reconhecer o nome e pensar que a única utilização da adenosina seja para o suprimento de energia às células, e essa é de fato uma de suas funções (especificamente a adenosina trifosfato, conhecida como ATP), mas ela também influencia esse ritmo biológico. Ao longo do dia, existe um acúmulo contínuo de adenosina no prosencéfalo basal, mediante um processo de digestão​ realizado por uma degradação enzimática de parte do ATP presente em nosso corpo. Ou seja, ao longo do dia, o ATP perde fosfatos e é acumulado em formato de adenosina. Durante o sono, o processo é revertido, ela recebe de volta os fosfatos e volta a ser ATP, diminuindo esse acúmulo. Isso é importante, pois essa substância é um neurotransmissor inibitório, que inibe processos associados à vigília. Ela promove a sensação de cansaço que você sente gradualmente ao longo do dia. Por essa razão, caso alguém vire a noite e fique acordado por quase 40 horas, a ‘pressão do sono’ e o cansaço do indivíduo será em dobro, devido à quantidade de adenosina acumulada.


Figura 3 - Acúmulo de adenosina (processo S) e o ciclo circadiano
Figura 3 - Acúmulo de adenosina (processo S) e o ciclo circadiano

Melatonina

A melatonina é conhecida como o hormônio do sono. Ele é produzido naturalmente pelo corpo e seu gatilho é a falta de luminosidade, informada pelo núcleo supraquiasmático. Sua produção acontece na glândula pineal, no hipotálamo. Esse hormônio depende da ingestão do aminoácido essencial triptofano para ser produzido (encontrado em alimentos como chocolates mais amargos, em banana, carne, aves, peixes, ovos, leite, queijo, nozes, sementes, legumes e grãos integrais​).

Isso significa que o sinal para seu corpo entrar em um estado propício ao sono é o escuro. Por essa razão, muito se fala dos malefícios da exposição a luz de eletrônicos antes de dormir, pois eles comprometem a produção desse hormônio.

Cortisol

Esse hormônio está relacionado ao estado de vigília. Trata-se de um hormônio esteroide produzido pelas glândulas localizadas acima dos rins, em resposta a estímulos do hipotálamo e da glândula pituitária​. Também conhecido como o hormônio do estresse, é ele que nos mantém em alerta e nos sentindo acordados. Na maioria dos casos, esse hormônio tem sua máxima de manhã cedo, indicando ao seu corpo a necessidade de acordar, e tem um declínio ao longo do dia. Existem, porém, ocasiões onde o nível de estresse do indivíduo pode estar tão desregulado que esse declínio não aconteça corretamente e que ele tenha, portanto, dificuldade de se ‘desligar’ no momento do sono.


Figura 4 - Relação entre os níveis de cortisol e melatonina regulado pelo ciclo circadiano
Figura 4 - Relação entre os níveis de cortisol e melatonina regulado pelo ciclo circadiano

Individualidade de cada um

É preciso notar, entretanto, que não existe um padrão universal para todas as pessoas. O relógio biológico de cada um é individual e tem seu próprio cronotipo. Os mais conhecidos são os denominados ‘early bird’ e ‘night owl’ (que pode ser traduzido do inglês como pássaro matinal e coruja noturna, respectivamente). Além disso, cientistas vêm conduzindo pesquisas que indicam que o ciclo circadiano do ser humano passa por uma mudança de acordo com a idade. Isso significa que uma pessoa em seu tempo de criança tem um relógio biológico diferente em sua adolescência, e outra em sua fase adulta.





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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[9]SANAR MED. Serotonina: para que serve e como identificar a sua baixa. Disponível em: https://sanarmed.com/serotonina-para-que-serve-e-como-identificar-a-sua-baixa-posmed/.


[10]SLEEP CENTER INFO. Which hormones affect sleep? Disponível em: https://sleepcenterinfo.com/blog/which-hormones-affect-sleep/.


[11]SLEEP FOUNDATION. Circadian Rhythm. Disponível em: https://www.sleepfoundation.org/circadian-rhythm.


[12]SLEEPSCORE. Learn About Adenosine. Disponível em: https://www.sleepscore.com/blog/learn-about-adenosine/.


[13]STORY MAPS. Disponível em: https://storymaps.arcgis.com/stories/643b988969884874ac7a309f9b5c1890.


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[16]YOUTUBE. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=R57ocxW3faA.


[17]YOUTUBE. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=DHpCBmq_z60.


[18]YOUTUBE. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Y8ZXOfWUbms.


[19]YOUTUBE. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2BoLqqNuqwA.


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