O protagonismo da ciência e dos veículos de promoção de saúde pública durante o período de pandemia evidenciou a importância da pesquisa no que diz respeito ao atendimento das demandas populacionais. Estar na linha de frente do enfrentamento do vírus da COVID-19 representou um enorme desafio para os pesquisadores, mas trouxe inúmeros avanços, dentre os quais pode-se destacar o desenvolvimento da vacina em tempo recorde, alcançado graças ao estudo da biologia molecular.
A biologia molecular compreende o estudo da relação entre o material genético dos organismos e os fenômenos biológicos. Seu objeto de estudo compreende macromoléculas, estruturas de massa molar elevada, formadas por uma grande quantidade de átomos, os quais ligam-se através de ligações covalentes, como DNA, RNA e proteínas, protagonizando o desenvolvimento de pesquisas acerca do material genético, mecanismos de replicação genética e relações entre os ácidos nucleicos com os ribossomos na síntese proteica.
O material genético contém as informações genéticas que determinam as características do ser vivo. No caso do vírus, a estrutura do seu genoma pode ser de DNA ou RNA. No ácido nucleico, estarão contidos os genes responsáveis pelas informações supracitadas, as quais são importantes para a codificação de proteínas, capazes de produzir respostas imunológicas. Isso significa que quando um indivíduo é infectado por um vírus, o sistema imune produz anticorpos específicos, os quais tentam combater o vírus, que, por conta do mecanismo de replicação viral, sofre mutações que o tornam mais resistente e dificultam a ação do sistema.
As mutações dos vírus são eventos naturais dentro do ciclo evolutivo. É comum principalmente nos vírus de RNA, como o SARS-CoV-2, os quais condensam suas partes no citoplasma, enquanto os de DNA, no núcleo. Em algumas situações, as mutações podem gerar proteínas de superfície no vírus, que são as responsáveis pela neutralização da ação do sistema imunológico. Uma das principais contribuições da biologia molecular no contexto de pandemia foi possibilitar, além do diagnóstico da doença e identificação da origem infecciosa, o entendimento das mutações sofridas pelo vírus, por meio do sequenciamento genético.
O sequenciamento genético ajuda a revelar características do ser vivo, o que auxilia no tratamento de doenças e identificação de patologias que o organismo tenha tendência a desenvolver. Ele pode ser entendido como uma técnica que utiliza processos bioquímicos para identificar as bases nitrogenadas que fazem parte da cadeia do ácido nucleico. As análises supracitadas são realizadas por meio do estudo do genoma, onde estão localizadas as informações genéticas do ser vivo.
O mapeamento do genoma do vírus é importante para entender sua trajetória de contaminação, bem como justificar a existência de cepas mais virulentas e resistentes. O sequenciamento é realizado por meio da amostra viral, removendo o material genético de outras moléculas. As informações genéticas do patógeno são comparadas com as de outros vírus, a fim de identificar a família viral e a sua relação com os que se manifestam de maneira similar, compreendendo sua origem, o que ajuda a combatê-lo.
O material genético do vírus da COVID-19 está contido no interior do vírus. O mesmo é envolto por um escudo proteico, contendo proteínas que ligam-se aos receptores de células humanas, invadindo-as. Uma dessas proteínas é a Spike. Tal conhecimento facilita a produção de vacinas mais eficazes, com anticorpos que combatem diretamente esse tipo de proteína.
Tratando-se de mutações, a mudança de alguns aminoácidos na proteína Spike é um sinal de alerta para pesquisadores, pois pode desenvolver características no vírus que o tornam mais resistente, tais como maior transmissibilidade, antigenicidade, virulência e patogenicidade. Todos esses aspectos são investigados quando surge uma nova variante, a fim de descobrir se as características iniciais do vírus foram alteradas.
A vigilância epidemiológica que identificava os estágios do vírus e suas respectivas mutações só foi possível por conta do mapeamento do genoma da COVID-19. A partir de tais estudos, foi possível investigar o impacto da doença na população e iniciar medidas de saúde pública que buscavam diminuir o avanço do vírus.
Para mapear o genoma do coronavírus, foi necessário o conhecimento acerca da genômica comparativa, explorando cerca de 42 cepas do Sarbecovírus, examinando bases de DNA e RNA em busca de padrões evolutivos e relações entre as espécies hospedeiras do vírus. A partir disso, foi possível identificar as regiões responsáveis pela codificação de proteínas no vírus. Além disso, foram identificadas as mutações do vírus que o tornavam mais perigoso por serem mais contagiosas e serem capazes de burlar o sistema imune com mais facilidade.
A Doutora Jaqueline Góes, pesquisadora brasileira, integrou a equipe responsável pelo sequenciamento do vírus 48 horas após a identificação do primeiro caso no Brasil. A partir disso, foi possível identificar a rota de transmissão do coronavírus, desenvolver vacinas e identificar o tratamento para a doença.
As vacinas produzidas no Brasil foram feitas a partir de um vetor viral não replicante, chamado adenovírus, o qual foi geneticamente modificado para gerar anticorpos sem oferecer riscos à saúde humana. O processo de produção da vacina passou por etapas de expansão celular, nas quais as células são multiplicadas e infectadas pelo vírus, para que ele se multiplique. Logo em seguida, ocorre o rompimento celular, seguido do tratamento enzimático que quebra as moléculas infectantes. Depois disso, partes das células são removidas por filtração e posteriormente o vírus é purificado e, por fim, concentrado e colocado na solução que possui os componentes da formulação da matéria-prima da vacina, o Ingrediente Farmacêutico Ativo. A vacina passa pelo processamento, que envolve etapas de inspeção, rotulagem e controle de qualidade.
Diante disso, pode-se perceber que o enfrentamento da pandemia deu-se graças ao trabalho e dedicação de pesquisadores e agentes de saúde, os quais, em virtude do seu compromisso com a saúde pública e com o desenvolvimento científico, trabalharam buscando alternativas de enfrentamento à emergência de saúde pública que a COVID-19 representou até 2023. O avanço que a biologia molecular representa ajudará a população no enfrentamento de diversas demandas de saúde, bem como na manutenção do bem estar populacional.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
[1] Saiba como é feita a vacina da COVID-19. Ministério da Saúde, 2022. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/janeiro/saiba-como-e-feita-a-vacina-covid-19-fabricada-100-no-brasil. Acesso em: 28 de fev. de 2024
[2] Biomédica comanda equipe de cientistas que sequenciou genoma do coronavírus no Brasil. Conselho Regional de Medicina, 2020. Disponível em: https://www.google.com/url?q=https://crbm5.gov.br/biomedica-comanda-equipe-de-cientistas-que-sequenciou-genoma-do-coronavirus-no-brasil/&usg=AOvVaw37X75fhqSyuPjLIMGhbrWt&hl=pt_BR. Acesso em: 28 de fev. de 2024
[3] Sequenciamento do coronavírus possibilita o desenvolvimento de vacinas. TJDFT, 2020. Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/informacoes/programas-projetos-e-acoes/pro-vida/dicas-de-saude/pilulas-de-saude/sequenciamento-do-coronavirus-possibilita-o-desenvolvimento-de-vacinas. Acesso em: 28 de fev. de 2024
[4] Doutora formada na ufba que liderou o primeiro sequenciamento genético do coronavírus no Brasil. UFBA, 2020. Disponível em: https://coronavirus.ufba.br/doutora-formada-na-ufba-que-liderou-o-primeiro-sequenciamento-genetico-do-coronavirus-no-brasil. Acesso em: 28 de fev. de 2024
[5] Mutações do coronavírus. Blog Sabin, 2020. Disponível em: https://www.google.com/url?q=https://blog.sabin.com.br/covid-19/mutacoes-do-coronavirus/%3Famp%3D1&usg=AOvVaw2R8uZtQ_IE7UeTXFGfkPLK&hl=pt_BR. Acesso em: 28 de fev. de 2024
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