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  • Foto do escritorLuiza Alvernaz

Ambientalistas atacando obras de arte: ativismo ou crime?

Estou encarando, fixamente, os olhos dela. Ela me olha de volta, pelo canto, como quem não teme ser pega espiando seus visitantes. Olhar doce, mas firme, alheio às dezenas de câmeras que apontam em sua direção e aos que subiram centenas de degraus somente para virem ao seu encontro. Postura típica de celebridade de longa data, cuja fama não se restringe a este século, nada a faz perder a postura. Escrevo este artigo diretamente de Paris, mais especificamente da famosa “Salle des États", no célebre Museu do Louvre, perturbada com o olhar fixo à mim. Quem me encara é Mona Lisa, pintada por Leonardo Da Vinci há mais de quinhentos anos.


Olhar para Lisa del Giocondo, personalidade retratada no quadro, me faz lembrar imediatamente dos últimos acontecimentos que levaram seu nome às manchetes: Mona Lisa levou uma tortada na “cara” como forma de protesto ambientalista. Diante de toda sua perfeição, desde as pinceladas certeiras à escolha de tonalidades do artista, encontro-me dividida: como admiradora das artes, sinto revolta pelo ato que colocara em risco uma das maiores produções da humanidade; por outro lado, preocupada com o futuro do planeta, busco entender as motivações e efeitos por trás de tal extremismo manifestado.


O caso em questão não é o único desse tipo a chocar o mundo nos últimos meses: Os Girassóis, de Van Gogh, “tomou um banho” de sopa de tomate. Les Meules, Monet, purê de batatas. Morte e Vida, de Klimt? Tinta preta. O que parecia um caso isolado na França, logo se tornou muito mais habitual do que o esperado.



"Mona Lisa", de Da Vinci, e "Os Girassóis", de Van Gogh, após ataques com comida


É fato que nenhuma das pinturas foi danificada graças as películas de vidro que as protegem de poeira, eventuais acidentes ou vandalismos como esses. Ainda assim, a pergunta que não sai da cabeça é: por quê? Por que ambientalistas acreditam que, depredando patrimônios da humanidade, eles resolverão algum problema?


Os ativistas ambientais têm um longo histórico de manifestações radicais, com o intuito de chocar a população e, assim, promover a discussão de pautas que defendem. Algumas delas, inclusive, colocaram a vida dos protestantes em risco. Aqui no Brasil, destaca-se, por exemplo, a faixa do Greenpeace que foi colocada sobre um dos braços do Cristo Redentor, local de difícil e perigoso acesso.



Banner do Greenpeace no Cristo Redentor, 2006, Rio de Janeiro

Aos espectadores, o ataque às obras parece sem sentido algum: proteger a arte não implica degradar os ecossistemas; ambos podem ser preservados simultaneamente. Assim, qual seria a lógica em tais atos? Apenas gerar sentimentos de raiva e indignação no público?


Em parte, a resposta é sim. Isso porque as obras de arte são escolhidas a dedo pelos ativistas justamente por estarem blindadas por películas que formam uma barreira entre o ambiente e a criação. Dessa maneira, a tática desses grupos é reproduzir a imagem de um ataque, não um propriamente dito, dado que nada é realmente danificado.


O objetivo é justamente gerar desconforto e angústia no público com a ideia do desastre cultural e social que seria a perda destes artefatos tão importantes para a história - o que se assemelha, em parte, à desgraça (e ao risco) que será para a humanidade e para o planeta se os recursos naturais se esgotarem completamente.


O ativismo ambiental do século XXI é intrínseco às redes sociais, que ocupam cada vez mais espaço no dia a dia dos bilhões de indivíduos que formam a população mundial. A performance, então, não tem um intuito degradador, mas “viralizador”: ela é validada pela circulação de imagens na mídia, pelos milhares de compartilhamentos, likes e comentários. Seu objetivo, que justifica atos tão radicais, é alcançar o máximo de pessoas possíveis, para colocar em pauta questões como a ambiental, mensurando sua importância aos valores artísticos e monetários extravagantes.


Ainda que não haja qualquer dano aos bens e que entenda-se a lógica por trás desses ataques, vandalizar um bem, público ou privado, mesmo que sem danificá-lo permanentemente, ultrapassa os limites de liberdade de qualquer cidadão, configurando-se como um crime ao patrimônio. Obras como as de Da Vinci, Van Gogh e Klimt, por exemplo, são patrimônio da humanidade e, apesar de desvinculadas à natureza, também merecem proteção.


Cabe a nós, espectadores, refletirmos se a nobreza da mensagem justifica a ação e manifestarmos nossa opinião.




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