O que a recente explosão do foguete Starship pode representar para o futuro da SpaceX?
Na última quarta-feira (20), a SpaceX conduziu um teste não tripulado do foguete Starship em sua base conhecida como "Starbase" em Boca Chica, no Texas (EUA). Para aqueles que não acompanharam o lançamento ao vivo pelos canais oficiais da empresa, a explosão, pouco após sua decolagem, fez manchetes pelo mundo inteiro.
No dia 18 de agosto, a empresa havia programado o lançamento desse mesmo foguete e até mesmo o abasteceu completamente. Porém, uma válvula de controle de pressão apresentou problemas e o teste foi adiado para dois dias depois.
Às 10h33 (horário de Brasília) do dia 20, os motores do veículo foram acionados e milhares de pessoas ao redor do mundo assistiram ao foguete mais poderoso da história em seu voo inaugural. O teste não era tripulado e não havia nenhuma carga a ser entregue em órbita. O único objetivo, de acordo com a empresa, era coletar dados e, principalmente, realizar uma decolagem bem-sucedida, sem explodir enquanto o foguete estivesse no chão.
No minuto seguinte à decolagem, tudo parecia estar dentro do previsto: a nave havia saído com segurança da base e parecia seguir a rota programada sem problemas. Porém, com imagens da parte de baixo do foguete, já era possível ver que 5 das 33 turbinas não haviam sido acionadas. Isso fez com que a nave perdesse estabilidade.
Nos dois minutos seguintes, via-se do solo que a nave começou a girar e "virar" como se estivesse voltando para a terra em um trajeto desgovernado. Mas a confirmação do problema veio quando a separação prevista dos dois estágios da aeronave não aconteceu, evidenciando que o teste passava por problemas técnicos.
Foi nesse período de tempo que os espectadores viram o foguete se "desmontando" completamente, perdendo sua forma e posteriormente explodindo. A empresa caracterizou o acontecimento como uma "desmontagem não programada".
A repercussão nas redes sociais
Logo depois da explosão do foguete a própria SpaceX se pronunciou pelo Twitter dizendo:
“Como se o teste de voo não fosse emocionante o bastante, a Starship acaba de passar por uma rápida desmontagem não programada antes da separação de estágios”
“Com um teste como esse, o sucesso vem com o que aprendemos, e o teste de hoje nos ajudará a melhorar a confiabilidade na Starship, enquanto a SpaceX procura transformar a vida em multi-planetária.”
“Parabéns à toda a equipe da SpaceX por esse emocionante primeiro teste do sistema integrado Starship.”
O post foi recebido com felicitações e críticas pelos usuários da rede. Alguns deles foram:
“Não é uma falha, e sim um caminho para o sucesso” (@MonkeysArmy2023)
“Isso só é um começo de uma nova era, nunca desista e comece de novo, está nos nossos genes como exploradores e como nossos ancestrais sempre fizeram. Para o primeiro teste, foi uma ótima tentativa. Foi mágico.” (@ThorfaIl_)
Entretanto, nem todos apoiaram a empresa:
"Costumávamos chamar isso de “falhas catastróficas”. Isso não foi uma “rápida desmontagem não programada”... nem um pouco … nem por definição. Ótimo trabalho cobrindo a verdade.” (@YourDarkLordLuc)
A história do projeto Starship
“A espaçonave Starship da SpaceX e o foguete Super Heavy - coletivamente chamados de Starship - representam um sistema de transporte totalmente reutilizável projetado para transportar tripulação e carga para a órbita da Terra, Lua, Marte e além. O Starship será o veículo de lançamento mais poderoso do mundo já desenvolvido, capaz de transportar até 150 toneladas métricas totalmente reutilizáveis e 250 toneladas métricas descartáveis.”
Site oficial da SpaceX
No ano de 2016, durante o congresso internacional de astronáutica, o fundador da SpaceX, Elon Musk, apresentou sua ideia de um foguete reutilizável de dois estágios, que poderia tornar a viagem interplanetária possível. Embora já tivesse apresentado algumas ideias para o projeto em 2012 e alterado seu nome algumas vezes, a ideia parecia não sair do papel.
Em 2017, o nome do foguete foi finalmente revelado como BFR (Big Falcon Rocket, ou "Grande Foguete Falcon"), e a SpaceX anunciou seus planos para usar o foguete para viagens à Lua e Marte, com o lançamento de missões de carga previstas para 2022 e missões tripuladas para 2024.
No final de 2017, a SpaceX começou a procurar locais para a construção e lançamento do BFR e já começou sua produção, embora ainda não tivesse um local definido. No início de 2018, a construção do protótipo estava em andamento e uma nova base de produção estava sendo construída no porto de Los Angeles. Em maio de 2018, cerca de 40 funcionários da SpaceX trabalhavam no projeto. Mais tarde, em agosto, o exército dos Estados Unidos demonstrou interesse em usar o BFR para transporte rápido de carga terrestre.
No final de 2018, Musk anunciou planos para o projeto #dearMoon, que previa o envio de um BFR para a Lua em 2023. Nesse mesmo período, o sistema finalmente ganhou seu nome final como Starship, assim como ambos os estágios do foguete: Starship (estágio superior) e Super Heavy Booster (estágio inferior).
Em 2021, a SpaceX recebeu 2,89 bilhões de dólares da NASA para desenvolver e fabricar o sistema Starship, assim como lançar duas missões para a agência espacial dos Estados Unidos. Desde então, a produção e lançamento dos foguetes se estabeleceu em Boca Chica, no estado do Texas, e vem mostrando um desenvolvimento e crescimento bastante rápido.
Entre 2019 e 2023, a SpaceX lançou oito protótipos de partes reduzidas do estágio superior do foguete, com quatro deles sendo destruídos em tentativas de pouso e quatro sendo bem sucedidos. É importante notar que a SpaceX é a primeira empresa de foguetes do mundo a tentar pousar as aeronaves. O procedimento normal seria deixar os estágios caírem no mar, como atualmente opera a NASA, por exemplo.
Nos dias atuais, o projeto Starship apresenta um desenvolvimento extremamente rápido, com uma grande alocação de recursos da SpaceX. Além disso, a NASA também está investindo na Starship, "cedendo" um local na área de lançamento 39A do Kennedy Space Center, onde está construindo instalações para o lançamento dos foguetes Starship. A NASA está trabalhando em parceria com a SpaceX, fornecendo financiamento e suporte técnico para o desenvolvimento do sistema Starship, mas ainda está desenvolvendo seu próprio foguete para viagens para a Lua, o Space Launch System (SLS).
Porque a “falha” não está nem perto de ser um problema para Musk?
Com outros 2 foguetes prontos e mais 3 em construção, Elon Musk não poupa esforços e recursos para acelerar a produção do sistema Starship, tanto que o mesmo postou em sua conta do Twitter logo após o teste: “Parabéns SpaceX por esse teste emocionante! Aprendemos muito para o próximo lançamento em alguns meses”.
Essa característica do modus operandi de Elon na SpaceX não é novidade. Com o tão bem-sucedido foguete Falcon 9, o bilionário insistiu no potencial do mesmo foguete após falhas nos oito primeiros modelos. Mas, à beira da falência, o Falcon 9 foi bem-sucedido e recebeu um contrato bilionário da NASA. Isso aconteceu após diversos testes e muitas "desmontagens não programadas".
A indústria aeroespacial foi fundada em falhas. Essas falhas datam dos programas Mercury e Apollo da NASA. Após anos de muitas explosões ao tentar superar os soviéticos na corrida espacial, os americanos pisaram na Lua em 1969 e mudaram a história da ciência.
Com bilhões de dólares para investir e algumas das mentes mais brilhantes da engenharia em sua folha de pagamento, a SpaceX considera esse teste um grande sucesso e o verdadeiro início da exploração multi-planetária. Com isso, o projeto Starship não foi abalado com o incidente do dia 20.
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